A 8ª Conferência Estadual de Saúde do Rio de Janeiro começou ontem com defesas enfáticas do Sistema Único de Saúde e busca pela revogação da EC 95
Sem meias palavras. Os participantes da Cerimônia de Abertura da 8ª Conferência Estadual de Saúde, que compuseram a Mesa inicial, deram o tom do que deve ser abordado nos grupos de trabalho que vão discutir a saúde do estado e formular propostas para a 16ª Conferência Nacional de Saúde. Recepcionados pela boa infraestrutura logística e humana da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, os cerca de 600 delegados e delegadas oriundos de mais de 80 municípios se depararam com o tom forte e objetivo das autoridades, dos membros do CNS e do estado, dos parlamentares, dos usuários do SUS e dos profissionais de saúde presentes na Mesa que, numa defesa obstinada do SUS e numa intenção de seu resgate dos princípios originais, contemplaram o público.
Homenagem à memória da conselheira Mara Christina
A 8ª CESRJ teve um grande momento de emoção durante a homenagem à conselheira estadual Mara Christina Martins Freire, falecida após um acidente de automóvel no mês de fevereiro, quando se dirigia para uma reunião em seu Conselho Municipal de Angra dos Reis. A irmã de Mara, a senhora Katya Regina Clemente Martins, recebeu das mãos da presidente do CES-RJ, a senhora Zaira da Costa, uma placa em memória da conselheira. Devido à forte emoção, Katya não conseguiu terminar o seu agradecimento. Mara Christina dedicou toda sua carreira ao Controle Social e ao SUS e é exemplo para todos aqueles que se propõem em seguir sua tenacidade. A 8ª Conferência é dedicada a ela.
As falas dos integrantes da Mesa de abertura
Após a solenidade do Hino Nacional, tocado pela banda da Polícia Militar, e dos agradecimentos à Comissão Organizadora, equipe técnica do CES-RJ e da Secretaria de Estado de Saúde e voluntários da Relatoria (estudantes e residentes), a presidente do Conselho, Zaira da Costa, saudou os presentes e agradeceu a receptividade da UERJ e de seu Reitor, o senhor Ruy Garcia Marques. Zaira iniciou sua fala posicionando-se pela revogação imediata da EC 95, medida de contenção de gastos do governo federal que pode retirar os já escassos recursos para a Saúde. A presidente também se mostrou preocupada com o Decreto Nº 9.795, que terminou com a secretaria de gestão participativa e rebaixou o Departamento de HIV/Aids, além de extinguir do programa de atenção integral aos portadores de doença falciforme.
Thaísa Guerreiro, membro da Coordenadoria de Saúde e Tutela da Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro, ressaltou a importância do tema da conferência, Saúde e Democracia, e conclamou os representantes do Controle Social para a defesa do SUS, além de tecer críticas ao teto de gastos imposto à Saúde.
Luiza Dantas, conselheira estadual de saúde e coordenadora da Comissão Intersetorial de Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora do CES-RJ, representou o seguimento dos profissionais de saúde. No seu momento à mesa, Luiza lembrou que esta era a hora de resgatar os princípios estipulados para o SUS durante a 8ª Conferência Nacional de Saúde, ocorrida em 1986, que garantiu o Controle Social na Constituição Federal de 1988. Por “estar em risco”, Luiza reafirmou a necessidade da democracia elencada como uma das bases do Sistema Único de Saúde. Luiza concluiu falando da importância da valorização do trabalhador do SUS, alertou sobre riscos da privatização da saúde e dos problemas advindos das Organizações Sociais (OSs) na gestão dos hospitais.
Marcos Castilho, presidente do Conselho Nacional da Pessoa com Deficiência, reprovou a medida do Executivo Federal que extinguiu os conselhos sociais criados por meio de decretos, principalmente aqueles ligados à saúde e aos Direitos Humanos. Castilho comunicou aos presentes que o CNPD está atuando na árdua tarefa de convencer o governo a rever a extinção de importantes colegiados do Controle Social no país. Castilho fez questão de agradecer ao secretário de estado de saúde, o senhor Edmar Santos, pelo empenho em prol da saúde do estado e pediu que este tenha um olhar sensível às pessoas com deficiência.
Elaine Pelaez, representante do Conselho Nacional de Saúde, arrancou fortes aplausos dos presentes quando, num duro discurso, atacou o que ela entende como graves problemas conjunturais do país. Pelaez iniciou sua fala lembrando Bertold Brecht: “que tempos são estes que temos que defender o óbvio?”. Elaine, elencando diversos temas atuais interligados, disse que a proposta de reforma da Previdência tem o poder de tirar direitos dos trabalhadores, afirmou que a Emenda Constitucional 95 deve ser revogada, pois congela os recursos da saúde, se mostrou crítica às OSs, que numa subversão de um SUS estatal e financiado coletivamente, está sendo entregue à iniciativa privada. Numa crescente discursiva, Elaine mostrou indignação com a morte do músico Evaldo dos Santos Rosa, alvejado com 80 tiros pelo exército, no bairro de Guadalupe, no subúrbio do Rio, exigiu a elucidação do assassinato da vereadora Marielle Franco e lembrou das massivas manifestações dos estudantes em defesa da Educação, ocorrida no último dia 15 de maio. Elaine ressaltou a importância da construção coletiva durante as conferências estaduais e nacional, chamou à resistência os cidadãos preocupados com os retrocessos na saúde e em vários outros setores, buscando sempre a representatividade e a visibilidade dos mais vulneráveis e, finalizou, interligando os direitos à educação, transporte, moradia, etc, como elementos inerentes à saúde e qualidade de vida, além da necessidade de se resgatar os princípios da 8ª CNS, socializando os bens e a riqueza.
Marcia Carreira Lustosa, representante do Ministério Público, agradeceu a presença de todos, agradeceu a presença do secretário Edmar Santos e desejou produtivos trabalhos dos delegados e delegadas na conferência, principalmente em um momento de profundos retrocessos na saúde brasileira.
Márcio Pacheco, representante do Tribunal de Contas da União falou da importância do planejamento e do controle na saúde e lembrou das diversas iniciativas das instituições fiscalizadoras do país para a área da saúde. Pacheco ressaltou, porém, que o “trabalho dessas instituições de nada vale se o conselheiro e a conselheira não fizer seu papel como fiscalizador”, caso contrário, o sistema “irá ruir”.
Renata Odete, representante do Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro informou aos presentes que o TCE mantém uma Escola de Gestão, onde são oferecidos cursos dessa área para conselheiros da saúde. Renata continuou sua fala fazendo um alerta para a situação financeira difícil no estado, além da crise política instalada. Numa afirmação direta à Secretaria de Estado de Saúde, e “aproveitando a oportunidade”, Renata disse que a SES vive “uma crise de identidade”, já que as ações descentralizadas não estariam sendo respeitadas com relação aos municípios. Renata pediu que as ações da SES “sejam um consolidado” do que é estipulado pelas secretarias municipais de saúde.
Maria Celia, representante do Conselho de Secretarias Municipais de Saúde parabenizou os presentes, lembrou que está no SUS há 35 anos – e que chegou a ser perseguida pela Ditadura – falou de suas ações e de sua secretaria com relação aos destinos orçamentários em Niterói e afirmou que o Sistema Único de Saúde é “um dos mais generosos do mundo”, daí a importância de se defendê-lo sempre.
A deputada estadual, Enfermeira Rejane, começou agradecendo à presidente Zaira da Costa, por esta ter se empenhado em realizar a conferência estadual apesar de todas as dificuldades inerentes ao momento atual. A deputada aproveitou o ensejo para falar da situação difícil pela qual passa a classe trabalhadora depois da Reforma Trabalhista, “que retirou direitos”, e da tentativa de reforma da Previdência, quando a população poderá perder ainda mais parte o que foi conquistado, por exemplo na Saúde, quando da luta pela implementação dos princípios do SUS. Rejane fez questão de lembrar que, além da crise econômica no estado, o Rio passa por uma crise ética e política profunda, notadamente quando “uma quadrilha” teria abalado seus recursos, numa alusão aos dois últimos ex-governadores presos.
Martha Rocha, presidente da Comissão de Saúde da ALERJ, congratulou os servidores da Assembleia Legislativa do estado pelos seus empenhos na contribuição para o funcionamento da Comissão de Saúde e incentivou os presentes à conferência a darem continuidade na imprescindível tarefa do Controle Social na Saúde.
O reitor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, o senhor Ruy Garcia Marques, parabenizou a todos os presentes à mesa, nomeando detalhadamente suas áreas de atuação. Ruy Garcia exortou a população a defender seus direitos à Saúde, à moradia, ao trabalho e elencou os desafios para a “manutenção de um SUS forte e universal”. Ruy afirmou que “é com imensa satisfação que a UERJ recebe a 8ª CESRJ”.
Finalizando a Mesa de Abertura, o secretário de estado de saúde, o senhor Edmar Santos, congratulou os presentes e iniciou sua fala lembrando quando era diretor do Hospital Universitário Pedro Ernesto, momento em que “viveu, na prática, a defesa e a resistência do SUS”. Edmar parabenizou, em especial, a presidente Zaira da Costa e à todos aqueles que se envolveram na organização da conferência, em que pesem os percalços enfrentados no dia-a-dia. O secretário falou um pouco também sobre sua gestão à frente da SES/RJ e de que maneira ele e sua equipe buscam sempre ”o diálogo e o entendimento”, mantendo a Secretaria de portas abertas para todos e todas com bastante “parceria”.
A noite do primeiro dia de conferência se encerrou com uma palestra bem detalhada sobre o financiamento do SUS e os perigos da EC 95 na Saúde do país, ministrada por Carlos Ocké Reis. Um coquetel no saguão de entrada foi oferecido aos participantes.
O Conselho Estadual de Saúde transmitiu ao vivo a Abertura da 8ª CESRJ. A conferência continua no sábado com os eixos temáticos, terminando no domingo, quando então serão eleitos os delegados e delegadas para a delegação do estado do Rio de Janeiro que irá para Brasília.
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Daniel Spirin Reynaldo/Ascom CES-RJ